18.9.09

Namorar

Um amigo escreveu esse poema de Carlos Drummond no Facebook e rendeu vários comentários.
Que bom que o assunto Namoro permance em alta!!!
Eu amo namorar, amo beijar na boca, amo dividir o dia-a-dia e crescer com alguém.
Não é 12 de junho, mas viva quem namora, viva os namorados!!!!

Segue o lindo poema!

Namorado: ter ou não, é uma questão

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não renumeradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, de saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia.

Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil, mas namorado mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser parruda, decidida, ou bandoleira: Basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.

Quem não tem namorado não é quem não tem um amor: é quem não sabe o gosto de namorar. se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes, mesmo assim pode não ter namorado.

Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho.

Não tem namorado quem transa sem carinho, quem acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem ama sem alegria. Não tem namorado quem faz pactos de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade, ainda que rápida, escondida, fugida ou impossível de durar.

Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinicius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar, de gargalhar quando fala junto ou descobre a meia rasgada; de ânsia enorme de viajar para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.

Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer sesta abraçado, fazer compra junto.

Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor.

Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d'água, show do Milton Nascimento, bosque enluarado, ruas de sonhos ou musicais da metro.

Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não se chateia com o fato de o seu bem ser paquerado.

Não tem namorado quem ama sem gostar, quem gosta sem curtir, quem curte sem aprofundar.
Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim-de-semana, na madrugada ou no meio-dia de sol em plena praia cheia de rivais.

Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir com ele.

Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado porque descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e de medo, ponha a roupa mais leve e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras, e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo da sua janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fadas. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria. Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. Enlou-cresça.

Carlos Drummond de Andrade

5.9.09

Luis Fernando Veríssimo . Dar

Dar é Dar - Luís Fernando Veríssimo
Fazer amor é lindo, é sublime, é encantador, é
esplêndido.
Mas dar é bom pra cacete.
Dar é aquela coisa que alguém te puxa os
cabelos da nuca...
Chama-te de nomes que eu não escreveria...
Não te vira com delicadeza...
Não sente vergonha de ritmos animais.
Dar é bom.
Melhor do que dar, só dar por dar.
Dar sem querer casar...
Sem querer apresentar pra mãe...
Sem querer dar o primeiro abraço de Ano Novo.
Dar porque o cara te esquenta a coluna
vertebral...
Te amolece o gingado...
Te molha o instinto.
Dar porque a vida é estressante e dar relaxa.
Dar porque se você não der pra ele hoje, vai
dar amanhã,
ou depois de amanhã.
Tem pessoas que você vai acabar dando, não tem jeito.
Dar sem esperar ouvir promessas,
sem esperar ouvir carinhos, sem esperar ouvir
futuro.
Dar é bom na hora.
Durante um mês.
Para os mais desavisados, talvez anos.
Mas dar é dar demais e ficar vazio.
Dar é não ganhar.

É não ganhar um "eu te amo" baixinho perdido no
meio do escuro.
É não ganhar uma mão no ombro quando o caos da
cidade parece querer te abduzir.
É não ter alguém pra querer casar, pra
apresentar pra mãe, pra darão primeiro abraço de Ano Novo e pra falar:
"Que que cê acha, amor?"
É não ter companhia garantida pra viajar.
É não ter pra quem ligar quando recebe uma boa
notícia.
Dar é não querer dormir encaixadinho...
É não ter alguém pra ouvir seus dengos...
Mas dar é inevitável...
Dê mesmo, dê sempre, dê muito...
Mas dê mais ainda, muito mais do que qualquer
coisa, uma chance ao amor.
Esse sim é o maior tesão...
Esse sim relaxa, cura o mau humor,
ameniza todas as crises e faz você flutuar...